Último post antigo, da disciplina da Silvia Amélia, em 2008. Uma historinha.
Quando eu era pequeno e não alcançava o interruptor da luz, o mundo era maior. Meu irmão, menor que o mundo, maior que eu, também não conseguia alcançar o interruptor. A pouca estatura nos impedia, dentre todo o resto, de acender ou apagar a luz e dar sinal para o ônibus. Antes de alcançar a campainha do 1203, inventaram o botão de dentro do ônibus, e aprendi que de vez em quando o mundo cresce pra baixo.
No apartamento da minha avó, eu e meu irmão competíamos pra ver quem alcançava a janela da sala, nem eu, nem ele. Lá fora sempre ficava longe demais, quando estávamos dentro. Então, eu e meu irmão inventamos a brincadeira de crescer, ganha quem enxergar mais longe. Os olhos chegavam no batente? “Olha, meu nariz já fica pra fora!”, “Consigo ver a janela do prédio de frente”.
Por mais que me esforçasse, meu irmão sempre me venceu. O que ele conseguia fazer nesta semana, eu apostava que conseguia fazer na próxima. Então eu crescia, até conseguir. Mas o interruptor continuava muito alto, não conseguia, nem esticando braços, pernas e pés, ai, suava, gemia, estalava, mas não conseguia.
Um dia de noite, acordei de um sonho ruim, com muito medo, medo de monstro, medo de barulho, medo de sombra e, sobretudo, medo do escuro. Meu irmão foi até a porta, na ponta dos pés, clique, luz acesa. Sentou no cantinho da minha cama e esperou que eu deitasse novamente. Trocamos olhares confiantes, ele voltou para apagar a luz, “na próxima, você acende”, e dormimos. Crescer dói nos ossos e tem gente que fica achando que é na alma. Hoje, meu queixo bate na janela e já quase dá pra ver o outro lado da rua.