Infanto-juvenil parte 1

Havia uma história para ser contada e não se sabe bem ao certo quando foi que ela se perdeu. A história começava com um drama adolescente e envolvia a morte dos pais de dois irmãos, um menino e uma menina. O menino era mais velho, devia ter uns doze anos, enquanto a menina tinha oito e guardava com facilidade o rancor pelo que o irmão não fez, mas achava que havia feito, e que a guiaria por todo o enredo. Era uma história, que já foi perdida.

O menino se sentia culpado pela morte prematura dos pais, mortos em um misterioso incêndio da casa em que moravam. A menina usava a culpa do irmão para mantê-lo próximo. Uma vez órfãos, se mudaram para a casa de uma tia, irmã da finada mãe, e essa tia tinha uma filha da idade do menino órfão. Primos, eram apaixonados um pelo outro, mas a menina órfã sentia ciúmes, e, o menino órfão, culpa. Isso e mais algum pudor pelo grau de parentesco os mantinha afastados desde o fatídico dia em que os corpos do pai e da mãe já sem vida foram levados ao hospital, em que o menino tentou se matar em um lugar que só ele e a prima sabiam qual era, e que a prima o foi resgatar e o resgatou, ainda que nenhum mal ele pudesse se auto-infligir da forma que tentara.

A tia que acolheu os jovens órfãos era paraplégica desde um acidente alguns anos atrás, em que, fazendo  acrobacias no ar, despencou no picadeiro. Seu marido, que na época deveria segurá-la, de dor e de culpa, não conseguiu voltar ao circo. Ela não desistiu e, ainda que sem pernas, dava aulas para jovens trapezistas, sua filha, a prima apaixonada, inclusive. A culpa consumiu o casamento, o marido a deixou não pela falta das pernas, mas por querer se manter distante do universo que ela ainda cultivava, por preferir redes de segurança a arriscar-se novamente no vazio. Ainda que separado, o casal se amava e, vez ou outra, dava uma escapadela para consumar esse amor, retornando à rotina de guarda compartilhada logo depois.

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